A Síndrome Antissintetase (SAS) é uma doença autoimune rara, pertencente ao grupo das miopatias autoimunes sistêmicas, em que o próprio sistema imunológico passa a atacar estruturas do corpo, especialmente músculos, articulações e pulmões.
O nome dessa síndrome vem da presença de autoanticorpos antissintetase. Autoanticorpos são proteínas produzidas pelo sistema imunológico que atacam as células e tecidos saudáveis do corpo. Antissintetases são enzimas essenciais para a produção de proteínas. Portanto, os autoanticorpos antissintetase se voltam contra as enzimas do próprio corpo.
A idade média de incidência da Síndrome é 50 anos e a prevalência, embora mundialmente desconhecida, é duas vezes superior no sexo feminino.
O que causa
A causa exata da SAS ainda é desconhecida, mas sabe-se que fatores imunológicos, genéticos e ambientais podem contribuir para seu surgimento. O principal aspecto imunológico é a presença dos autoanticorpos circulantes, especialmente o anti-Jo-1 (o mais comum), anti-PL-7, anti-PL-12, anti-EJ, entre outros, os quais definem a doença e influenciam o quadro clínico de cada paciente.
Esses autoanticorpos são produzidos pelo sistema imunológico e atacam as aminoacil-tRNA sintetases, que são enzimas essenciais para a produção de proteínas nas células. A presença desses autoanticorpos desencadeia uma resposta inflamatória crônica, que causa danos às estruturas do corpo.
No que diz respeito à predisposição genética, certos genes, como os associados ao complexo de histocompatibilidade principal (MHC), parecem aumentar a suscetibilidade de determinada pessoa a desenvolver a Síndrome. Essa predisposição influencia a forma como o sistema imunológico reage a gatilhos ambientais, determinando se uma resposta autoimune será ou não iniciada.
Por fim, os fatores ambientais agem como gatilhos em indivíduos geneticamente predispostos, iniciando a resposta autoimune. Algumas infeções virais podem, por exemplo, desencadear essa resposta, assim como a exposição a certas substâncias, como tabaco, solventes, mofo e excrementos de pássaros. A agressão crônica causada por esses fatores pode ativar repetidamente o sistema imunológico, levando a uma perda da tolerância imunológica e, por fim, à manifestação da SAS.
Principais sintomas
A SAS costuma ter uma manifestação variável, mas há um conjunto clássico de sinais que ajuda no reconhecimento:
- Febre no início da doença, sem causa aparente.
- Doença pulmonar intersticial (DPI): inflamação e fibrose do tecido pulmonar, provocando falta de ar, dor no tórax e tosse seca. Acomete cerca de 90% dos pacientes.
- Miosite: inflamação dos músculos, gerando fraqueza, principalmente nos ombros, quadris e pescoço. Atinge cerca de 90% dos pacientes e aparece antes ou junto com o acometimento dos pulmões.
- Artrite ou artralgia: dores articulares, às vezes acompanhadas de inchaço e rigidez. Acomete 50% dos pacientes.
- “Mãos de mecânico”: pele grossa, escamosa e endurecida na palma das mãos e nas laterais dos dedos. Essa manifestação pode ser a chave para o diagnóstico da doença.
- Fenômeno de Raynaud: leia aqui no Blog.
Nem todos os pacientes apresentam os mesmos sintomas — alguns podem ter apenas envolvimento pulmonar, outros predominância muscular ou articular. Estudos têm indicado que esses desfechos dependem da presença dos autoanticorpos. Pacientes com anti-Jo-1, por exemplo, tendem a apresentar todos os sintomas; já aqueles com anti-PL-7 e anti-PL-12 costumam apresentar DPI, mas menos frequentemente têm miosite; e pacientes com anti-EJ costumam apresentar miosite, DPI e artrite/artralgia.
Como é feito o diagnóstico
O diagnóstico é clínico-laboratorial e requer uma boa avaliação médica, geralmente feita por reumatologista. Como não existe um único exame que confirme a doença, os passos mais comuns incluem:
1. Exames de sangue- Dosagem de enzimas musculares (CK, aldolase),
- Pesquisa de autoanticorpos antissintetase (anti-Jo-1, anti-PL-7, anti-PL-12 etc.).
- RX de tórax ou Tomografia computadorizada de tórax (TCAR) para avaliar doença pulmonar intersticial.
- Musculares: Eletroneuromiografia; Dosagem de enzimas musculares; Biópsia muscular.
- Cardiológicos: Ecocardiograma transtorácico para avaliar possível pressão alta pulmonar.
O desafio é que a SAS pode se confundir com outras doenças, como Artrite reumatoide, Doença mista do tecido conjuntivo e outras miopatias autoimunes sistêmicas, exigindo um olhar clínico experiente.
Tratamento
Não há cura definitiva para a SAS, mas o tratamento visa controlar a inflamação, aliviar sintomas e prevenir danos aos órgãos.
A estratégia depende do grau de comprometimento, especialmente pulmonar.
Os principais recursos terapêuticos incluem:
- Corticosteroides (prednisona): base do tratamento inicial, usados para reduzir a inflamação.
- Imunossupressores: como azatioprina, metotrexato, micofenolato mofetil ou ciclofosfamida, usados para reduzir a necessidade de corticoide e controlar a doença a longo prazo.
- Imunoglobulina intravenosa (IVIg) ou rituximabe: opções em casos resistentes.
- Fisioterapia e reabilitação: fundamentais para garantir a função pulmonar e preservar a força muscular e prevenir atrofia.
- Monitoramento pulmonar regular, com pneumologista, quando há envolvimento intersticial.
Prognóstico
O prognóstico varia bastante conforme o tipo e a intensidade do comprometimento.
Pacientes com DPI grave ou anticorpos específicos (como PL-7 e PL-12) tendem a ter evolução mais delicada. Já aqueles diagnosticados precocemente e tratados de forma adequada podem levar uma vida relativamente normal, com controle da doença e poucos surtos.
O segredo está no acompanhamento multidisciplinar — reumatologista, pneumologista, fisioterapeuta.
Com cuidado contínuo, acompanhamento especializado e adesão ao tratamento, é possível controlar a inflamação, preservar a função pulmonar e manter a qualidade de vida.

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